A mão que minutos antes tinha emprestado a um desejo.
Todos temos direito à vida, todos temos direito a viver como queremos, não deveríamos ter também direito a escolher como morrer?
Ela era nova, diziam-lhe que tinha todo o tempo do mundo para fazer o que queria, que tinha a vida pela frente...ela ouvia isto deitada na cama do hospital, aquela cama semelhante a tantas outras onde estivera ontem e anteontem e antes, muito antes até à sua primeira memória.Ela era nova, talvez demasiado nova para passar pelo que passou, mas também quando é que se é suficientemente velho para enfrentar o fim de uma vida que não se viveu?Todos acreditavam, ou queriam acreditar, que ela iria sair dali bem, muito melhor do que qualquer um dos que a visitavam, os cientistas, os médicos existem para quê? para curar claro está...Mas as vezes não é assim, e o que ela tinha ninguém sabia curar, o que ela sofria poucos conseguiam imaginar, o que ela queria ninguém quis aceitar.Enquanto ela pedia que não a reanimassem quando tivesse um novo ataque, enquanto ela pedia para não a ligarem a um ventilador, enquanto ela em fase terminal em que estava, no perfeito juízo em que se encontrava, tentava numa aparente calma (porque forças já não havia para discussões) explicar àqueles que a rodeavam o que era parar de insistir em evitar o inivitável, enquanto dizia que não era desistir, mas sim decidir sobre si, sobre a sua vida, sobre a sua morte, cada um daqueles "que a amavam acima de tudo" saiam do quarto batendo com a porta, resmungando monossílabos misturados com soluços sufocados e a cada batida da porta de juntava uma batida do seu (dela) coração...Quando a última pessoa, que estava o quarto, bateu a porta ao sair, também o coração parou de bater, num soluço bem mais sufocado do que qualquer um dos outros, no entanto, talvez bem mais descansado ou até liberto!
Cá fora os outros discutiam a "tolice que lhe (a ela) deu para dizer", entre os choros da mãe, do pai, da avó. Se calhar todos eles tentavam afogar a sua dor, sem pararem para pensar nela.Quando a última pessoa saiu do quarto, todos se viraram e viram a porta a bater, todos viram a figura que de lá saia, todos a viram encostar-se na parede e escorregar por ela abaixo como se à espera que alguém lhe desse a mão, talvez a mão que minutos antes tinha emprestado a um desejo... todos notaram a tristeza daquele olhar, uma tristeza de perda, do que se teve e já não se tem, daquilo que não volta, só depois mais tarde se aperceberam que ouvir já era tarde...
(texto originalmente publicado a 29 de dezembro de 2004 in impressoesdigitais.weblog)
Ela era nova, diziam-lhe que tinha todo o tempo do mundo para fazer o que queria, que tinha a vida pela frente...ela ouvia isto deitada na cama do hospital, aquela cama semelhante a tantas outras onde estivera ontem e anteontem e antes, muito antes até à sua primeira memória.Ela era nova, talvez demasiado nova para passar pelo que passou, mas também quando é que se é suficientemente velho para enfrentar o fim de uma vida que não se viveu?Todos acreditavam, ou queriam acreditar, que ela iria sair dali bem, muito melhor do que qualquer um dos que a visitavam, os cientistas, os médicos existem para quê? para curar claro está...Mas as vezes não é assim, e o que ela tinha ninguém sabia curar, o que ela sofria poucos conseguiam imaginar, o que ela queria ninguém quis aceitar.Enquanto ela pedia que não a reanimassem quando tivesse um novo ataque, enquanto ela pedia para não a ligarem a um ventilador, enquanto ela em fase terminal em que estava, no perfeito juízo em que se encontrava, tentava numa aparente calma (porque forças já não havia para discussões) explicar àqueles que a rodeavam o que era parar de insistir em evitar o inivitável, enquanto dizia que não era desistir, mas sim decidir sobre si, sobre a sua vida, sobre a sua morte, cada um daqueles "que a amavam acima de tudo" saiam do quarto batendo com a porta, resmungando monossílabos misturados com soluços sufocados e a cada batida da porta de juntava uma batida do seu (dela) coração...Quando a última pessoa, que estava o quarto, bateu a porta ao sair, também o coração parou de bater, num soluço bem mais sufocado do que qualquer um dos outros, no entanto, talvez bem mais descansado ou até liberto!
Cá fora os outros discutiam a "tolice que lhe (a ela) deu para dizer", entre os choros da mãe, do pai, da avó. Se calhar todos eles tentavam afogar a sua dor, sem pararem para pensar nela.Quando a última pessoa saiu do quarto, todos se viraram e viram a porta a bater, todos viram a figura que de lá saia, todos a viram encostar-se na parede e escorregar por ela abaixo como se à espera que alguém lhe desse a mão, talvez a mão que minutos antes tinha emprestado a um desejo... todos notaram a tristeza daquele olhar, uma tristeza de perda, do que se teve e já não se tem, daquilo que não volta, só depois mais tarde se aperceberam que ouvir já era tarde...
(texto originalmente publicado a 29 de dezembro de 2004 in impressoesdigitais.weblog)
11 Comments:
Estou a ver que já tenho mais um sítio por onde passar :)
Bejo
Olá impressão!!
Obrigada pela visita! Tenho anbandoando um pouco o meu sitio... Tenho que ver se volto depressa às lides da escrita...
Beijinho!
PS - Enviei-te um mail para o hotmail. :)
A vida escapa.
É válvula de escape.
todas as nossas emoções são egoístas.
Mil beijos fresquinhos…
BShell
⊇⊆ Não te sabia de posse de mais que um blog ⊇⊆ apesar de o outro já ter terminado, suponho. ⊇⊆ Fui lá, no entanto, e achei lindo [ o tal texto original ]. ⊇⊆ És detentora de uma enorme classe a escrever. ⊇⊆ Continua assim. ⊇⊆
• Beijocas e inté •
hum...
A morte é um assunto delicado. A historia um pouco perturbadora. Escolher a forma de morrer? Penso que ninguém diria não a esta pergunta...
Sem dor, sem sofrer, sem saber...
adorei a forma como escreveste,embora o tema seja delicado .a padido,eu tb emprestaria a minha mao .beijo
parabéns pelo teu texto...5 estrelas...
se todos nós temos direito a viver com dignidade...tb deveríamos ter o direito de morrer com dignidade...
Beijo
muito bom o conteudo, provoca em nos uma reflexão sobre ouvir ...
por vezes nos nao queremos palavras queremos apenos que nos oiçam, o mesmo acontece com os outros mas nems empre nos lembramos disso ...
beijos
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