sexta-feira, janeiro 27, 2006

Hoje apetece-me dizer...

... que o tempo faz-me ter memórias. Traz-me saudade. Torna-me mais velha. Passa e não volta atrás...

Entornei o café sob a mesa

Aqueci a água, dosei, com três colheres de chá, o café e com duas, o açúcar e deitei na chávena, que pousei em cima da mesa da cozinha.
O telefone tocou, fui atender.
“Sim?” – disse eu.
Pelo auscultador, ouvi o ritmo do ar que se inspira e expira, respirava alguém do outro lado da linha, mas não falava…
Pelo silêncio, deduzi quem fosse. Desliguei e corri para a porta. Abri a embalagem, li o bilhete que lá estava dentro, caiu-me uma lágrima; desembrulhei o que me era destinado, caiu-me a segunda lágrima…
Entrei em casa, pousei tudo na mesa, a mesma onde estava o café, dei um suspiro, que só suspirei na minha mente e num gesto rápido, a minha mão foi de encontro à chávena.
Entornei o café sob a mesa, inundando-a, fazendo com que gotas de café fossem pingando para a o chão.
Limpei o chão e com sofreguidão esfreguei a mesa. Notei que o bilhete estava encharcado, as letras mal se liam, escorriam na folha, como antes as lágrimas tinham escorrido na minha cara. O embrulho, já desembrulhado, estava molhado, agarrei o seu conteúdo e apertei-o contra o peito…fiquei a cheirar a café.

Ah! O que estava dentro do embrulho, nunca mais larguei.Quis que a sua presença fosse eterna e esqueci a despedida…
Guardo a memória do silêncio do telefonema e do que me foi dado, e que é estimulado sempre que bebo café…na mesa da cozinha, sozinha.

quarta-feira, janeiro 18, 2006

A mão que minutos antes tinha emprestado a um desejo.

Todos temos direito à vida, todos temos direito a viver como queremos, não deveríamos ter também direito a escolher como morrer?
Ela era nova, diziam-lhe que tinha todo o tempo do mundo para fazer o que queria, que tinha a vida pela frente...ela ouvia isto deitada na cama do hospital, aquela cama semelhante a tantas outras onde estivera ontem e anteontem e antes, muito antes até à sua primeira memória.Ela era nova, talvez demasiado nova para passar pelo que passou, mas também quando é que se é suficientemente velho para enfrentar o fim de uma vida que não se viveu?Todos acreditavam, ou queriam acreditar, que ela iria sair dali bem, muito melhor do que qualquer um dos que a visitavam, os cientistas, os médicos existem para quê? para curar claro está...Mas as vezes não é assim, e o que ela tinha ninguém sabia curar, o que ela sofria poucos conseguiam imaginar, o que ela queria ninguém quis aceitar.Enquanto ela pedia que não a reanimassem quando tivesse um novo ataque, enquanto ela pedia para não a ligarem a um ventilador, enquanto ela em fase terminal em que estava, no perfeito juízo em que se encontrava, tentava numa aparente calma (porque forças já não havia para discussões) explicar àqueles que a rodeavam o que era parar de insistir em evitar o inivitável, enquanto dizia que não era desistir, mas sim decidir sobre si, sobre a sua vida, sobre a sua morte, cada um daqueles "que a amavam acima de tudo" saiam do quarto batendo com a porta, resmungando monossílabos misturados com soluços sufocados e a cada batida da porta de juntava uma batida do seu (dela) coração...Quando a última pessoa, que estava o quarto, bateu a porta ao sair, também o coração parou de bater, num soluço bem mais sufocado do que qualquer um dos outros, no entanto, talvez bem mais descansado ou até liberto!
Cá fora os outros discutiam a "tolice que lhe (a ela) deu para dizer", entre os choros da mãe, do pai, da avó. Se calhar todos eles tentavam afogar a sua dor, sem pararem para pensar nela.Quando a última pessoa saiu do quarto, todos se viraram e viram a porta a bater, todos viram a figura que de lá saia, todos a viram encostar-se na parede e escorregar por ela abaixo como se à espera que alguém lhe desse a mão, talvez a mão que minutos antes tinha emprestado a um desejo... todos notaram a tristeza daquele olhar, uma tristeza de perda, do que se teve e já não se tem, daquilo que não volta, só depois mais tarde se aperceberam que ouvir já era tarde...


(texto originalmente publicado a 29 de dezembro de 2004 in impressoesdigitais.weblog)

Reler

Ando com falta de tempo para mim. Não tenho tempo para escrever, para imaginar. Nas páginas soltas do meu caderno, só vejo o branco, e a caneta parece secar quando toca a folha.
Por isto, e como forma de não me frustrar ainda mais, e para não deixar este blog parado, vou publicar textos de um outro blog meu (entretanto extinto), para os que já leram, releiam e paciência :), os que ainda não o fizeram: boa leitura!

Até já;
ImpressãoDigital

terça-feira, janeiro 03, 2006

Apeteceu-me dizer-vos isto....

Tenho instantes, momentos, sorrisos, sons, cheiros, sabores, fotografados na minha memória. Tenho as vossas caras, os vossos gestos, as vossas palavras, o som de cada gargalhada, o cheiro da noite, o paladar das bebidas, dos jantares... sinto o conforto da companhia, da vossa...e gosto.
Lembro-me dela a cantar, da outra a juntar-se, era um duo que passou depressa a trio...ai, somos um quarteto giro a cantar “Tudo o que eu te dou” com coreografia, com palavras trocadas, com amigos a juntarem-se, com olhares cúmplices deles, e outros olhares de espanto, de gozo, de brincadeira dos restantes, aqueles que por ali passam e não nos conhecem.
Gosto de me sentar À mesa e fazer tilintar os copos, uns contra os outros, gosto de conversar e comentar. Quero continuar com os cafés, com os encontros sem ser preciso marcar...
O que imagino: um carro, meia dúzia de trocos para a pousada, música... o resto nós já temos...

Obrigada pelo alento, pelo incentivo ao meu sonho, pela companhia, pelas lágrimas, pelas palavras, por sentirem comigo!! Eu sei que nós conseguimos... vá lá temos “o carro a rolar por esta estrada fora”...